O ideal é olhar para o problema e perceber que existem muitos caminhos a seguir, e que as soluções são tão ou mais adequadas de acordo com a nossa maturidade.
“Se seu problema tem solução, por que você está preocupado? Se seu problema não tem solução, por que você está preocupado?” Essas duas perguntas, unidas e encadeadas pela mesma lógica, me foram feitas por um amigo meu, quando contei a ele que estava preocupado. Como isso aconteceu há alguns anos, nem lembro mais o que é que estava me afligindo. Provavelmente não era nada muito importante, tanto é que não mereceu registro em minha memória de longo prazo. Nem sei se o problema que me atormentava tinha, ou não, solução. Se foi, ou não, resolvido. Tanto faz, pois todos sobrevivemos às questões que nos incomodam e, ironia da vida, depois encontramos outros motivos para nos preocuparmos.
Não lembro o porquê de minha agonia, mas lembro da frase. Por que preocupar-se com algo que será resolvido? Basta que coloquemos alguma energia para solucionar a crise, e a solução se materializa. E por que preocupar-se com algo cuja solução está fora de nosso alcance, e que será, portanto, resolvido por conta própria, e cujo resultado talvez não nos agrade, mas era a única alternativa possível… e pronto?
Consultando a etimologia, descobrimos que preocupar-se é pré-ocupar-se, ou seja, ocupar-se de algo que exige atenção, dedicação e energia antes do tempo exato em que essas qualidades sejam, de fato, necessárias. Pela lógica primária, preocupar-se seria, então, além de desnecessário, inútil.
Lidando com as situações
Esse é um lado da história. O outro é que não há como resolver questões intrincadas, atender a momentos graves e viver em tempos difíceis sem dedicar tempo ao pensamento reflexivo necessário ao amadurecimento das ideias e à consulta ao arsenal de memórias que funcionam como munição de ataque às dificuldades. Por esse ângulo, preocupar-se ou ocupar-se a tempo é necessário e útil.
E então? Devemos ou não nos preocupar diante da eminência de um problema, de uma dificuldade ou de uma catástrofe? Há pessoas que vivem preocupadas com algo e acabam se tornando, muitas vezes, desagradáveis. “Ele vive preocupado, parece que sua vida é uma eterna tragédia” – diria você sobre esse tipo. “Ele é um inconsequente. Não se preocupa com nada” – julgaria você sobre o outro tipo.
Vamos procurar uma luz que nos permita enxergar com clareza. Diante de uma dificuldade, e no tempo que a antecede, talvez seja adequado não preocupar-se, e sim ocupar-se, fazendo algo em prol da solução possível. Não se previnem nem se enfrentam dificuldades apenas com intenções, muito menos com sentimentos aflitivos.
Em momentos de dificuldades – e todos nós passamos por eles –, ocorre uma diminuição natural do campo reservado ao erro. Quando uma crise nos assola, parece que perdemos o direito de usar o tempo para experimentações. Precisamos urgentemente de encaminhamentos mais precisos, decisões mais acertadas. “Não posso errar” – pensa você com seus botões.
E, então, toda e qualquer decisão parece se transformar em um fato binário. Tudo passa a ser adequado ou inadequado, certo ou errado, importante ou não importante. E, simplesmente, não podemos escolher o dígito errado. Essa é a verdadeira fonte de toda a preocupação. A redução do espectro da vida.
Oportunidades
Acontece que, diante de um problema, nós temos a forte tendência a “binarizar” nossa vida. Achamos que toda decisão, escolha ou ação vai se transformar na causa de um efeito que, por sua vez, será a causa de efeitos posteriores, e que só temos, portanto, uma opção: acertar. Essa relação de causalidade que conduz nossos destinos torna-se ainda mais dramática quando as margens que acomodam o erro se tornam mais estreitas. É o que acontece conosco diante dos problemas, sejam grandes ou pequenos, graves ou de consequência leve. Só que não. O computador é binário. A vida, não. Sempre haverá uma terceira via, uma quarta possibilidade, uma quinta solução. Basta limpar a mente, prestar atenção, observar com qualidade.
Lembro de um outro amigo que estava diante de uma encruzilhada. Tinha sido convidado para um novo cargo na empresa, e essa era uma daquelas oportunidades que podem definir um futuro. Seu entusiasmo, entretanto, desabou quando soube que, para assumir o tal cargo, ele teria que passar três meses na matriz da empresa, nos Estados Unidos.
Acontece que o tal estágio coincidia exatamente com a data de seu casamento com sua amada noiva, agendado havia um ano, com a igreja reservada, a festa contratada e os convites impressos. E agora, José?
Quando nos encontramos, este meu amigo estava com cara de espanto, com olheiras de noites maldormidas, com um semblante que denunciava seu estado. Preocupação, com todo o pacote: dúvida, angústia, medo, insegurança. A equação era simples: ou frustrava sua carreira ou frustrava seu casamento. Em qualquer uma das escolhas haveria choro e ranger de dentes. Ele não via saída. Foi quando eu lhe perguntei: “Você já falou com eles?”.
Ações que substituem
“Eles” eram as pessoas envolvidas na tal tragédia. De um lado, sua noiva. Do outro, o chefe que lhe havia feito o convite. Não, ele não tinha compartilhado com nenhum dos dois sua preocupação. Nem tinha lhe passado pela cabeça, pois, para ele, especialista em TI, o que se desenhava era um diagrama de fluxos, em que as respostas “sim” e “não” encaminhavam, cada uma, para direções opostas, com consequências graves, em ambos os casos.
O que se seguiu foi uma sequência de ações que substituíram as preocupações. Tanto sua noiva quanto seu chefe entenderam o drama do Zé, foram solidários e o ajudaram a encontrar não uma, mas várias alternativas. Ele aceitou o cargo, seguiu para o estágio no exterior, que foi interrompido por apenas cinco dias, incluindo um final de semana. O casamento aconteceu na data prevista, e a lua de mel foi substituída por uma estadia do casal em uma aprazível cidadezinha do centro-oeste americano, onde fica o headquarter de sua empresa. Final feliz.
Eu mesmo só estou preocupado quando não estou ocupado.
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